Futsal também se aprende assistindo!

Em minha formação universitária houve uma disciplina que fiz na Faculdade de Educação que destacou a importância da aprendizagem vicária (pela visão) como um processo pedagógico, pois alunos buscam sempre referências que exemplifiquem e mostrem possibilidades de atitude, ações técnicas integradas com a tomada de decisão, para que possa significá-los e transferir aquilo o que foi significado para o momento da aula.
Essa possibilidade pedagógica, no entanto, por muito tempo foi interpretada como a necessidade do professor ser um bom praticante da modalidade, para que através de seus exemplos os alunos pudessem copiá-lo e assim aprenderem a jogar.
Isso trouxe consigo dois problemas sérios:

(1) somente o professor ex-jogador é quem seria capaz de desenvolver boas aulas, pois ele seria o exemplo mais adequado a ser seguido pelos alunos, fazendo prevalecer a crença de que quem não jogou aquela determinada modalidade não saberia ensiná-la;

(2) sendo o professor um ex-jogador, as aulas tornavam-se um ambiente de treinamento e especialização – em plena fase de iniciação esportiva – sendo que o aluno aprenderia a copiar o gesto técnico demonstrado pelo professor, executando-o em atividades tecnicistas e isoladas.


Ora, a aprendizagem visual possibilita avançar o tempo da aula para além do espaço da aula. Trata-se de um recurso que extrapola o ambiente de aprendizagem propriamente dito. Assistir um jogo de Futsal pela TV, por exemplo, torna-se uma extensão da aula além do ambiente formal, possibilitando ao aluno significar o jogo a partir de suas perspectivas pessoais, adquirir um lastro cognitivo sobre o planejamento de ações no jogo que posteriormente podem ser testadas no ambiente de aula.
(Alunos da Equipe Dura-lex/ Oeste Paulista de Futsal do Professor Augusto Rena)

O conceito de linha da bola e a leitura de um sistema defensivo

O conceito de linha da bola é universal em relação a modalidades esportivas coletivas que se apóiam na idéia de invasão. Dessa forma, faz parte de um emaranhado conceitual ligado aos Princípios Operacionais dos esportes coletivos de Claude Bayer (1994).
Linha da bola é uma linha imaginária paralela à linha de fundo, definida pela posição da bola no campo de jogo. É uma reta traçada de uma lateral à outra do campo, passando por cima da bola, a qual delimita o campo de ação da defesa na intenção de impedir a aproximação e finalização do ataque à meta.

Quanto maior é o número de jogadores de defesa atrás da linha da bola, ou seja, entre essa referência e a meta defendida, menor o espaço de ação dos atacantes, e, ainda, maior é a indução para um passe errado ou um passe para trás. Esse conceito em questão respeita os Princípios Operacionais de defesa de Claude Bayer, busca dificultar a progressão dos atacantes ao campo e a finalização à meta, facilitando o processo de retomada da posse de bola.
Veja na figura a seguir:

Note que a Linha da Bola é demarcada no ponto onde se encontra a bola naquele momento específico, ou seja, ela varia de acordo com sua movimentação. Observe também que os jogadores de marcação (vermelhos) posicionam-se sempre atrás dela, induzindo que o ataque não avance em seu campo e que o passe mais fácil seja o recuado (linha tracejada).

Porém, quando um marcador não a respeita, facilita a ação do ataque, visto que além de desocupar uma área entre a bola e a meta defendida, ainda induz não o passe para trás, mas sim, o passe em direção ao gol (linha tracejada)

Quanto mais jogadores uma equipe posicionar atrás da linha da bola, maior é a compactação defensiva, e maior é a possibilidade de indução de passes errados ou recuados por parte do ataque.

O Jogo – Lúdico e Sério, isso é possível?

Quando abordo ao falar sobre o ensino do Futsal com base no jogo, como ferramenta pedagógica, isso parece um equívoco, pois a visão sobre o jogo comumente limita-se sobra sua característica de diversão e ludicidade, desprovido de um caráter sério, que para muitos é considerado um elemento essencial para que a aprendizagem seja consumada.

Não questiono que a ausência de seriedade num processo de ensino aprendizagem é algo que minimiza as chances de que a aprendizagem seja assimilada pelos alunos/atletas que se envolvem em nossas aulas.
Logo, admito que para ensinar deve haver seriedade por parte de alunos e professores, pois a atitude séria possibilita maior atenção para que o objeto de aprendizagem seja realmente significado como um conteúdo a ser aprendido.

O jogo, por sua vez, é um elemento típico de liberdade, ludicidade e prazer, caracterizando-se, aparentemente, como algo típico para o relaxamento, a diversão e a livre adesão.
No entanto, trago uma pergunta: Jogar bola nas ruas, garante aprendizagem? Não são raros os relatos de grandes jogadores de diversas modalidades que descrevem as experiências vividas na rua como algo realmente significativo.

João Batista Freire, em sua tese de livre docência escrita no ano de 2001, chamada “Investigações Preliminares sobre o Jogo”, traz reflexões sobre a “Pedagogia da Rua”, mostrando a importância que os jogos de uma chamada “cultura de rua” possuem na formação da inteligência para o jogo.
No livro “Escola da Bola” de Christian Kröger e Klaus Roth, eles destacam que um dos objetivos dessa obra é procurar, de alguma forma, resiginificar de maneira sistematizada as experiências, cada vez menos potencializadas, de prática de jogos de rua, com diversos estímulos de inteligência tática, habilidades e capacidades coordenativas ali vividas com muita intensidade.

Logo, essas e outras experiências e propostas de trabalho fundamentam a capacidade que o jogo possui de gerar aprendizagens.

No entanto, ao observarmos o fenômeno jogo, percebemos que há nele além da presença da ludicidade e alegria, algo aparentemente contraditório: um jogo só é jogo se ele for jogado com seriedade.
Essa frase é que sempre uso como exemplo para demonstrar o quanto o jogo é uma ferramenta pedagógica por excelência, inquestionavelmente.

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“Um jogo só é jogo se ele for jogado com seriedade”
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